04 setembro 2008

Bonitinha, mas ordinária



Assim é a Língua Portuguesa para mim, como o título da peça de Nelson Rodrigues, um drama de paixão e ódio! Ao mesmo tempo que me encanta com suas múltiplas facetas, me faz odiar a vulnerabilidade de suas regras! Decididamente, tentar aprender e, pior, entender tantas regras é das lutas, a mais vã!

O pior é que as pessoas pensam que por eu ter feito Letras tenho a obrigação de dominá-la. Infelizmente não é bem assim. O que mais fazemos na faculdade é confrontar inúmeras explicações para um mesmo assunto, sem chegar a conclusão alguma.

A Língua Portuguesa é uma matéria em transição. Ela luta com as regras criadas em pleno Positivismo, que ainda são cobradas em concursos, entre os quais o vestibular, e uma visão totalmente dinâmica, inovadora, que comprova que tais regras contemplam uma língua irreal, que não existe na prática. Contudo, enquanto a gramática tradicional continuar sendo exigida, e não se encontrar uma teoria mais satisfatória que a substitua, que dê conta de toda diversidade linguística existente, ficaremos assim sem saber ao certo o que fazer, qual regra aplicar e, muito pior, o que ensinar. Se nem mesmo entre os grandes gramáticos existe um consenso em questões aparentemente simples, como: o que é sujeito oculto ou um sujeito inexistente! Cada qual apresenta a sua própria definição, que antes clarear fazem é jogar areia nos nossos olhos.

Grande parte dessa confusão começou por querermos dar à Língua um caráter de ciência. Sem dúvida, há sim muita previsibilidade na forma como ela se estrutura; podemos estabelecer sistemas, normas. Porém, temos que ter a clara consciência de que estas regras não darão conta de tudo. A Língua é um sistema vivo e aberto, ou seja, está em constante evolução e não se limita a padrões estanques, assim como toda ciência da área de Humanas.

Dizem que o que mais define um povo é a sua língua. Foi até por esse motivo que a Língua Portuguesa foi institucionalizada. Na época (1262), Portugal vivia em confronto com a Espanha, que volta e meia tomava o poder e dominava toda a península. O meio que o rei Dom Dinis encontrou para fortalecer o senso de nacionalidade entre os seus súditos, foi estabelecer uma língua comum e obrigatória para todos. Entre os vários dialetos existentes optou-se pelo português. Com isso criou-se uma barreira mais eficiente que milhares de soldados. Até que para portugueses eles foram bem espertos! Mas não poderiam ter escolhido alguma coisa mais simples?

Será que é significativo pensar que a língua é um retrato de nós mesmos e por isso temos a Língua Portuguesa com suas inumeráveis brechas, portas abertas a infinitas regras e interpretações? Bastante maleável, quem sabe para se moldar ao gosto do freguês? Assim como as palavras da nossa Constituição, escritas no bom e velho português, você sabe que a lei existe, mas pode ter tantas caras e interpretações quantas desejarmos, ou for conveniente.
Quem nunca desejou que nossa língua fosse como o inglês ou o alemão: regras claras! O sim que quer dizer sim, o não que diz realmente não? Eu desejo isso todos os dias! Pois não há um só dia que não tropece nesta bendita pedra que é Língua Portuguesa.